A reunião no rancho da Maricota foi bárbara !
Maricota e Sérgio são ótimos anfitriões - tudo preparado com carinho e delicadeza.
Desde o poema na entrada, as bandeirinhas da decoração, as flores no jardim, todos os detalhes cuidadosamente pensados.
As meninas estavam super animadas - todas com seus poemas escolhidos para o sarau litero-musical (a música ficou por conta dos anfitriões).
O menu preparado por Maricota à moda de D. Cida - comidinha árabe: babagamuche, homus, pepino com coalhada, tabule, salada árabe e cuscus marroquino à la Maria (à moda da casa).
Havia também copos poéticos: cada uma de nós recebeu uma taça com uma mensagem - versos de Paulo Leminsky.
Os autores escolhidos pelas meninas foram bem variados:
Ninica leu um texto de Mário Quintana
Regina Leonel leu " Meus oito anos"- de Casemiro de Abreu (bem daquelas épocas de Itapê)
Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!
Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais!
Como são belos os dias
Do despontar da existência!
— Respira a alma inocência
Como perfumes a flor;
O mar é — lago sereno,
O céu — um manto azulado,
O mundo — um sonho dourado,
A vida — um hino d'amor!
Que aurora, que sol, que vida,
Que noites de melodia
Naquela doce alegria,
Naquele ingênuo folgar!
O céu bordado d'estrelas,
A terra de aromas cheia
As ondas beijando a areia
E a lua beijando o mar!
Oh! dias da minha infância!
Oh! meu céu de primavera!
Que doce a vida não era
Nessa risonha manhã!
Em vez das mágoas de agora,
Eu tinha nessas delícias
De minha mãe as carícias
E beijos de minhã irmã!
Livre filho das montanhas,
Eu ia bem satisfeito,
Da camisa aberta o peito,
— Pés descalços, braços nus —
Correndo pelas campinas
A roda das cachoeiras,
Atrás das asas ligeiras
Das borboletas azuis!
Naqueles tempos ditosos
Ia colher as pitangas,
Trepava a tirar as mangas,
Brincava à beira do mar;
Rezava às Ave-Marias,
Achava o céu sempre lindo.
Adormecia sorrindo
E despertava a cantar!
Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!
— Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
A sombra das bananeiras
Debaixo dos laranjais!
Fernanda Cardoso mostrou fotos do livro " The family of Woman" .
Graça Barreto leu uma poesia de Baudelaire.
Maricota leu " Mar Português" - de Fernando Pessoa e declamou de forma graciosa " Maria " - de Antonio Correira de Oliveira.
Lucia Cardoso leu " Tu e você" - de Maria Luisa Perroni Passos - uma graça de poesia comparando a mulher portuguesa (tu) e a mulher brasileira (você).
Heloisa leu "Retrato" de Cecília Meirelles.
Eu levei 2 textos de Jorge Forbes: A globalização é uma mulher; e , Mulheres insatisfeitas.
A Globalização é uma Mulher
Ontem, a ordem unida; hoje, as muitas possibilidades.
Ontem, a luta por ser melhor; hoje, por ser singular.
Ontem, o falar grosso; hoje, o falar carinhoso.
Ontem, a razão dos números; hoje, a do afeto.
Ontem, o poder do pai; hoje, o da família.
Ontem, o amor disciplinado; hoje, o amor responsável.
Ontem, o treinamento; hoje, a experiência.
Ontem, o futuro previsível; hoje, o futuro inventado.
Ontem, a rebeldia; hoje, a diferença.
Ontem, o como chegar; hoje, o como escolher.
Ontem, o necessário; hoje, o desejável.
Ontem, o importante; hoje, o entusiasmo.
Ontem, a universalização masculina; hoje, a globalização feminina.
Mulheres Insatisfeitas
As mulheres são basicamente insatisfeitas, o que é o mesmo que dizer que são basicamente desejantes. Satisfeitos não desejam, para quê?
Elas são basicamente insatisfeitas por apontarem uma satisfação possível no que ainda virá, no amanhã. Dizê-las sonhadoras vem daí, desse olhar esperançado para um mais além.
Mulheres se satisfazem na diferença, no detalhe. Homens gostam da ordem unida, do grupo, da massa. Mulheres, não, elas não querem encontrar um vestido igual ao seu. Homens adoram o uniforme no trabalho: terno e gravata, ou o macacão; e uniforme nas festas: o smoking preto e branco, ainda por cima alugado.
Mulheres têm vários gozos na cama, homens tendem a um só, que esmaece em seguida.
Mulheres têm sempre muito a escolher, por não serem padronizadas, e como escolher sem a certeza garantida? Surge o desarvoramento, sentimento feminino por excelência.
A insatisfação feminina é doença ou avanço. Doença na histérica imobilizada em sua eterna queixa ao outro, do que lhe faltou. Avanço, normalidade, na sua exigência de uma satisfação além do limite, que não se contenta com os troféus que os homens lhes exibem, e elas pedem ainda mais, mais além das evidências. Se não fossem essas mulheres, atenção, mulheres, não as histéricas, ainda estaríamos na idade da pedra com os homens elogiando mutuamente seus tacapes.
Mulheres insatisfeitas, de desejo insatisfeito, querem novidade, mudança; homens satisfeitos, de desejo impossível, querem o mesmo, a segurança da repetição.
(Publicado na revista UMA, n. 56, maio de 2005).
O vinho não permitiu que eu anotasse todas as leituras - peço que as demais me ajudem enviando seus textos escolhidos.
Para finalizar Maricota nos mostrou o caderno de mensagens de sua mãe e fizemos uma rodada de leitura dos textos de seus tios e tias - um momento mágico que nos levou às lágrimas.
No total, muita risada e boas lembranças deram o toque naquele domingo azul.