FLIP 2014
Cinco dias de imersão
literária
Começou na última quarta-feira, 30 de julho, a 12ª Festa Literária
Internacional de Paraty, que vai até domingo.
Os ingressos para o maior evento – a tenda dos autores –
acabaram nos primeiros trinta minutos de venda, há um mês do início da FLIP. É
literalmente uma festa. A cidade fica lotada, todos querem ver e serem vistos.
Os escritores são tratados como pop-star –
filas gigantescas por um autógrafo, selfies
com seu autor favorito, posts no facebook, instagram – cada um vale-se do
que tem à mão para fazer parte da festa. E tudo colabora para deixar a festa
mais linda: o mar, a lua, as ruas de pedras irregulares, a arquitetura e a
história da cidade, os bares, a noite, o jeitinho brasileiro de se aproximar do
“artista”, a festa que termina sempre em encontro.
Neste ano, duas novidades: o show de abertura, com Gal
Costa, um presente à cidade e ao público, no meio da praça.
O show foi um acontecimento: Gal continua encantando com sua
beleza e graça. Mas faltou um brilho, algo que se perdeu. Ouvi-la cantando
Baby, Folhetim, Dom de iludir, O amor, Dia de domingo, Força estranha, Gabriela
– nos transportou para um tempo e uma voz daquela Gal Fatal que ficou na
lembrança.
A segunda novidade: pela primeira vez na sua história, a
Festa Literária Internacional de Paraty homenageia um autor contemporâneo e que
ainda participou da primeira edição da FLIP, em 2003: Millôr Fernandes.
Millôr morreu em março de 2012, aos 88 anos. Foi jornalista,
escritor, ilustrador, dramaturgo, argumentista, tradutor, inventor do frescobol e se definiu como “medalha de
ouro no concurso para si mesmo”. Num momento de tanta agitação política, um
nome como Millôr vem a calhar. Ninguém como ele criticou com humor a política
brasileira e deixou frases que ficarão na lembrança:
“Se é gostoso faz logo, amanhã pode ser ilegal”.
“Uma coisa, pelo menos, é positiva: a violência no mundo
inteiro aumentou consideravelmente nosso conhecimento de Geografia”.
“Tristezas não pagam dívidas. Nem bravatas, por falar nisso”.
“Pra fazer uma boa teoria é preciso muita prática”.
“A verdade não é só mais incrível que a ficção como é muito
mais difícil de inventar”.
“A verdade é aquilo que sobra depois que você esgotou as mentiras”.
“A vida é incurável”.
A homenagem ao escritor ficou por conta do crítico de arte
Agnaldo Farias, que também inovou: em
vez de fazer uma conferência sobre o homenageado, analisou uma série de
desenhos, caricaturas, colagens e pinturas de Millôr. Em seguida, um bate-papo
com Jaguar – um dos fundadores do Pasquim – e os humoristas Hubert e Reinaldo –
do grupo “Casseta & Planeta”. Faltou animação nessa roda, faltou Millôr.
A lista dos convidados para a programação principal é
extensa e composta por escritores, jornalistas, cineastas, fotógrafos,
arquitetos, pensadores brasileiros e estrangeiros. Dentre os convidados, Paulo
Mendes da Rocha – prêmio Pritzker de arquitetura em 2006 – traz um olhar
especial acerca da cidade. “Estamos aqui para ocupar os espaços de modo
transgressor, se possível”; vê a cidade como sedução espacial. Freud, em “O
Mal-estar na civilização” fala da inadequação entre o homem e o mundo. Paulo
insiste que a arquitetura tem como base essa inadequação, o conflito. Em sua
conferência na quinta-feira, Mesa 4 da Tenda dos Autores, falou sobre a
importância de convivermos com o conflito, que nisso está a maravilha da cidade
e que progresso nenhum anulará esse conflito. Foi a melhor conferência desse
dia da FLIP.
Outro convidado que vai chacoalhar as opiniões a respeito da
comida é o jornalista americano e professor de Berkeley, Michael Pollan, que
escreveu um livro para dizer “Coma comida. Não em excesso. Vegetais, sobretudo”.
Cacá Diegues, Edu Lobo, Fernanda Torres vão falar sobre cinema, música e
literatura. Muitos outros escritores disputarão os aplausos e listas de
autógrafos, nessa festa que promete trazer mais público que as anteriores. A
programação completa da FLIP pode ser consultada aqui: http://www.flip.org.br/flip2014.php
Qual será o resultado dessa jornada literária? Frequentei
quase todas as edições, em muitas fiquei em êxtase, e em outras me aborreci
profundamente com os mediadores – ora por sua limitação, ora por quererem
aparecer mais que o escritor convidado.
A FLIP é sempre uma surpresa, sempre vale a pena.
E, como disse Jorge Forbes, “por tudo isso, e mais, vou
à FLIP, até se for para não gostar. Aprende-se muito quando se
tenta explicar a discordância”.
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